“Vivo em Porto Alegre, dou aulas de arte, durmo tarde e acordo cedo. Assumi, recentemente, que escrever me faz tão bem. Aprendendo com os mais talentosos e experientes, arrisco, aqui e ali, uma palavra ou outra. Palavreio, desenho e me visito; assim, me vejo e reconheço. Melhor que isso, só deixar-me ler.” (http://www.anaeovisitador.blogspot.com/)
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WE´RE ALL IN THE DANCE
(Publicado pela primeira vez pela editora Mojo Books)
É o meu caminho. Passo todos os dias pela avenida que tem nome de constelação, sem calçadas, estrelada e explosiva. Toda a noite ouve-se o seu pipocar, ali onde cruza com a Ursa Maior. São barulhos estalados e gritos que doem. É salpicado de estrelas aquele chão. Cheio de furos, portas e paredes sangradas.
É ali. Cinco Estrelas Lanches, onde eles se encontram. Maria Francine, a que não se quer Maria, só Francine. Fica braba quando faço a chamada e esqueço, chamo pelos dois nomes, se ofende. E John Lenon, o menino franzino.
Eles são colegas de aula e Francine se comove com a fragilidade dele. Agora senta a seu lado, ajuda-o nas tarefas. A professora explica matemática, Francine tem de explicar de novo. Daí ele entende. Passou também a ajudá-lo nos temas. Só que, na aula, não mostram nada. Nem em lugar nenhum.
Foi na casa dele, isso ela me contou. Mas a casa não o é, umas tábuas, diz, chão batido. Fazem os temas meio que deitados num colchão sujo. “Aquele neguinho piolhento”, ela ri, mas é um riso doído. De carinho e do amor-que-não-se-pode.
“Já rolaram uns beijinhos, Francine?”
“Claro, ‘sora’. Até mais”. E ri, olhinho esperto.
John Lenon até gostaria, mas respeita a Francine. Ela é um mulherão, ele se acha feio. ‘Nego piolhento’, ela diz pra ele, com carinho.
Eles se encontram no Cinco Estrelas Lanches. John Lenon trabalha lá, à noite. Ajuda na cozinha, serve, lava pratos e limpa tudo. ‘Como a cara dele’, diz seu Juremir, o dono. Fala para todo mundo que fica com ele “só pra dar uma força, a família é gente boa, mas sem sorte, sabe como é.”
Francine apareceu por lá há, mais ou menos, dois meses. Nunca pensou que encontraria John Lenon, logo lá, onde ela não é ela, é a Francine no seu lado noite. E ela gosta de ser dia. É lá que John Lenon tem que encarar Francine-Noite.
Ela me conta sobre isso. Reluta, mas é louca pra contar. Espera que eu pergunte e ai fala, fala, fala, mas por trás da verdade, nunca de frente para ela.
É no Cinco Estrelas que eles se encontram, só de olhar, antes de Lorimar chegar, porque agora ela é dele, O Cara. Três amigos do Lori já ‘pegaram’ a Francine, mas ele não deixa mais ninguém, é dono da boca, é só dele a morena grande e cheia de carnes. A de coração doce e gentil. Ela, Francine-África.
Francine, a Maria, pensa que Lorimar é o melhor para sua vida, Patrão não é para qualquer uma. Ele não sabe de John Lenon, graças a Deus; por isso, não faz mais os temas com o John. Agora é só na aula. Sentar perto, coxa na coxa por baixo da classe, o máximo. Ah, e o olhar...Todos os colegas notam, eles pensam que não. Francine morre de medo, John Lenon, não. Ele enfrentaria leões, ela não. Ele atravessaria o Saara, ela não. Ele desbravaria o Continente Africano, peito aberto às armas, até as do Lorimar. O que não faria por ela, que é tudo o que tem de bom, por que não morrer por ela?
Só porque ela não quer, ela manda.
Ela já viu estrelas da noite salpicando cabeças, atravessando carnes, estalando ossos. Ela viu, ele não.
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WE´RE ALL IN THE DANCE
(Publicado pela primeira vez pela editora Mojo Books)
É o meu caminho. Passo todos os dias pela avenida que tem nome de constelação, sem calçadas, estrelada e explosiva. Toda a noite ouve-se o seu pipocar, ali onde cruza com a Ursa Maior. São barulhos estalados e gritos que doem. É salpicado de estrelas aquele chão. Cheio de furos, portas e paredes sangradas.
É ali. Cinco Estrelas Lanches, onde eles se encontram. Maria Francine, a que não se quer Maria, só Francine. Fica braba quando faço a chamada e esqueço, chamo pelos dois nomes, se ofende. E John Lenon, o menino franzino.
Eles são colegas de aula e Francine se comove com a fragilidade dele. Agora senta a seu lado, ajuda-o nas tarefas. A professora explica matemática, Francine tem de explicar de novo. Daí ele entende. Passou também a ajudá-lo nos temas. Só que, na aula, não mostram nada. Nem em lugar nenhum.
Foi na casa dele, isso ela me contou. Mas a casa não o é, umas tábuas, diz, chão batido. Fazem os temas meio que deitados num colchão sujo. “Aquele neguinho piolhento”, ela ri, mas é um riso doído. De carinho e do amor-que-não-se-pode.
“Já rolaram uns beijinhos, Francine?”
“Claro, ‘sora’. Até mais”. E ri, olhinho esperto.
John Lenon até gostaria, mas respeita a Francine. Ela é um mulherão, ele se acha feio. ‘Nego piolhento’, ela diz pra ele, com carinho.
Eles se encontram no Cinco Estrelas Lanches. John Lenon trabalha lá, à noite. Ajuda na cozinha, serve, lava pratos e limpa tudo. ‘Como a cara dele’, diz seu Juremir, o dono. Fala para todo mundo que fica com ele “só pra dar uma força, a família é gente boa, mas sem sorte, sabe como é.”
Francine apareceu por lá há, mais ou menos, dois meses. Nunca pensou que encontraria John Lenon, logo lá, onde ela não é ela, é a Francine no seu lado noite. E ela gosta de ser dia. É lá que John Lenon tem que encarar Francine-Noite.
Ela me conta sobre isso. Reluta, mas é louca pra contar. Espera que eu pergunte e ai fala, fala, fala, mas por trás da verdade, nunca de frente para ela.
É no Cinco Estrelas que eles se encontram, só de olhar, antes de Lorimar chegar, porque agora ela é dele, O Cara. Três amigos do Lori já ‘pegaram’ a Francine, mas ele não deixa mais ninguém, é dono da boca, é só dele a morena grande e cheia de carnes. A de coração doce e gentil. Ela, Francine-África.
Francine, a Maria, pensa que Lorimar é o melhor para sua vida, Patrão não é para qualquer uma. Ele não sabe de John Lenon, graças a Deus; por isso, não faz mais os temas com o John. Agora é só na aula. Sentar perto, coxa na coxa por baixo da classe, o máximo. Ah, e o olhar...Todos os colegas notam, eles pensam que não. Francine morre de medo, John Lenon, não. Ele enfrentaria leões, ela não. Ele atravessaria o Saara, ela não. Ele desbravaria o Continente Africano, peito aberto às armas, até as do Lorimar. O que não faria por ela, que é tudo o que tem de bom, por que não morrer por ela?
Só porque ela não quer, ela manda.
Ela já viu estrelas da noite salpicando cabeças, atravessando carnes, estalando ossos. Ela viu, ele não.
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